Projetos que vão do uso do gás natural, considerado combustível de menor impacto, ao potencial das eólicas em alto-mar foram debatidos no evento Diálogos RJ, promovido pelo Globo
De olho na transição energética para uma economia de baixo carbono, o Rio de Janeiro tem atraído investimentos que ajudarão a reduzir o volume de emissões de gases do efeito estufa. Os projetos incluem desde apostas em negócios nascentes — como as usinas de biometano (gás renovável substituto do gás natural) da Gás Verde, a expansão da rede da Naturgy, o polo logístico do Porto do Açu e um leque variado da Petrobras — até experimentos com eólicas em alto-mar.
Executivos dessas empresas falaram sobre planos de investimento e perspectivas futuras em mais uma edição do Diálogos RJ, seminário organizado ontem pelo jornal O Globo.
Pontapé
O pontapé para a nova fase de investimentos foi dado na semana passada. O governo estadual enviou à Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) seu novo plano. O foco é descarbonizar a matriz energética, desenvolver indústrias e serviços de baixo carbono e promover uma transição energética justa e inclusiva, resumiu Felipe Peixoto, secretário interino de Energia e Economia do Mar do Estado do Rio.
— O Rio extrai a maior parte de petróleo e gás do Brasil e produz energia nuclear. Não queremos viver só de passado e, sim, olhar para o futuro — disse Peixoto, que participou do painel “Políticas e regulações estratégicas para o desenvolvimento”, mediado por Alexandre Rodrigues, editor assistente de Economia do Globo.
Energia eólica offshore
A Petrobras firmou recentemente um memorando de entendimento com o governo estadual para a realização de estudos de viabilidade de um projeto-piloto de geração de eletricidade eólica offshore, com torres e turbinas instaladas em alto-mar. O experimento, perto do Porto do Açu, no norte do estado, será um dos projetos da estatal na área — o outro ficará no Rio Grande do Norte.
Em outra frente, a Petrobras vai investir em capturar e armazenar gás carbônico em Barra do Furado, em Quissamã, também no norte do estado. Maurício Tolmasquim, diretor de Transição Energética da estatal, lembrou ainda do uso do gás natural para abastecer termelétricas e substituir combustíveis que emitem mais gases, como o óleo diesel:
— No Rio, temos duas (usinas) térmicas e mais uma planejada para o Gaslub (refinaria que está sendo construída no lugar do antigo Comperj, em Itaboraí). A (geração de eletricidade) térmica é central. É necessário ter térmicas flexíveis, com avanço das renováveis. E, no Rio, vamos adotar a unidade de refino para fazer o coprocessamento de petróleo e óleos vegetais para produzir o diesel renovável.
Gás natural
Os investimentos para aproveitar a produção de gás natural também podem impulsionar a demanda por biometano, produzido a partir do processamento do biogás, gerado na decomposição natural de resíduos sólidos, do lixo urbano a rejeitos agropecuários.
Marcel Jorand, CEO da Gás Verde, disse que a empresa vai ampliar a produção de biometano de 160 mil para mais de 500 mil metros cúbicos/dia, até 2026, com novas usinas no Rio. A empresa opera a maior usina de biometano do país, que aproveita o biogás gerado no Aterro Sanitário de Seropédica, desde que o lixão de Gramacho foi desativado.
— O Rio é líder na produção de biometano no Brasil. Vamos ampliar essa liderança. Queremos atender à demanda de clientes que querem descarbonizar suas operações. Além disso, vamos inaugurar a primeira planta de triagem de lixo no Rio para separar o que é reciclável e transportar menos lixo — disse Jorand.
Biometano para caminhões
Christiane Delart, diretora de Distribuição da Naturgy, distribuidora do gás encanado na Região Metropolitana do Rio, lembrou que o gás natural é o combustível da transição energética — já que emite menos gases do que os combustíveis à base de petróleo.
Ela disse que a empresa quer levar Gás Natural Veicular (GNV) aos caminhões e, futuramente, usar biometano:
— A oportunidade é levar para o transporte pesado. Ao sair do diesel para o gás natural, você reduz em 25% as emissões. Com o biometano, você tem uma queda de 90%.
Mauro Andrade, diretor de Novos Negócios da Prumo Logística, que controla o Porto do Açu, disse que o Rio tem multiplicidade de oferta:
— Ao juntar a produção de biometano, gás natural, potencial de biogás e biocombustíveis, temos um diferencial.
Bernardo Rossi, secretário do Ambiente e Sustentabilidade do Estado do Rio, disse que, para conceder o licenciamento, a legislação estadual cobra que o investidor informe o volume de emissões de gases:
— Temos um núcleo só para apoiar empresas que querem fomentar a energia limpa.
Estado tem papel fundamental, dizem especialistas
O Rio de Janeiro tem um papel fundamental para acelerar a transição energética no Brasil, por conta de sua posição de liderança na produção de petróleo e gás — o estado é responsável por mais de 80% da produção nacional. Mas há desafios, de acordo com autoridades e especialistas que participaram ontem do seminário sobre transição energética.
— Podemos migrar o expertise do petróleo para outras fontes renováveis. O desafio da descarbonização é a redução das emissões (de gases de feito estufa), e isso passa não só pela substituição das fontes (de energia), mas pelo crescimento da economia e do Rio. E temos que fazer de forma sustentável. Há um grande contingente de pessoas vivendo abaixo do ideal, e há a expectativa de aumento no consumo de energia. Temos que garantir mobilidade urbana e permitir mais qualidade de vida nas residências — disse Heloisa Borges, diretora de Estudos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), estatal dedicada ao planejamento de longo prazo do setor.
Descarbonização
O deputado federal Hugo Leal (PSD-RJ), vice-presidente da Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, afirmou que o desafio é pensar em inclusão e descarbonização para as pessoas:
— No Rio, a transformação é diferenciada. Produção de petróleo offshore (em alto-mar) é no Rio. Precisamos conviver com isso e investir em projetos de baixa emissão. Além disso, as três usinas nucleares estão no Rio.
Felipe Gonçalves, superintendente de Pesquisas da FGV Energia, cobrou que incentivos introduzidos por políticas públicas ajudem a viabilizar os projetos, mas que sejam usados de forma planejada:
— É importante não demonizar isso e usar de forma mais inteligente do que já usamos no passado. Temos um quebra-cabeça com mais peças. Temos o desafio de abundância de oportunidades e de recursos. E essa complexidade gera um desafio regulatório. A transição tem a perspectiva da substituição do consumo de forma a ter uma geração mais sustentável e de como entregar uma energia mais limpa.
Renovação de concessões
Felipe Peixoto, secretário interino de Energia e Economia do Mar do Estado do Rio, lembrou ainda do processo de renovação das concessões de energia elétrica:
— Queremos permitir a ampliação de subestações e trazer energia mais barata. Temos a energia nuclear e queremos fortalecer a construção de Angra 3, que é uma energia limpa (em termos de emissões de gases de efeito estufa). Há muitos pedidos de investimento em energia solar. Na mobilidade urbana, temos o gás, mas queremos ir além, com veículos elétricos e, futuramente, hidrogênio verde e biometano.